Coluna Propaganda&Arte

Não sabe o que é greenwashing? Essa lavagem cerebral é proposital

por R. Guerra Cruz

Se você nunca ouviu falar do termo greenwashing provavelmente já caiu nesse golpe, mas isso não é exclusividade sua. Segundo a enquete que eu fiz no LinkedIn, mais de 60% das pessoas da minha rede também não faziam ideia do que era isso. Eu só fui aprender após fazer um curso específico na área de Gestão Empresarial Sustentável e ainda sigo aprendendo. O problema é que esse gap de conhecimento é planejado e o mercado tradicional não quer que a gente entenda esse assunto. A seguir, eu explico mais detalhadamente e de forma prática como não ser manipulado(a).

Confuso entender? A desinformação é a meta.

Greenwashing vem do inglês, algo traduzido como “lavagem verde”. Ou seja, dar aquela maquiada num produto para parecer sustentável. Esse termo ganhou ainda mais força dos anos 2000 pra cá depois de reuniões na ONU e a criação do Pacto Global, que é um documento que propõe diretrizes mais responsáveis e que todas as empresas e governos podem (compromisso voluntário) adotar para alcançar metas sociais, como de combate à fome, além de promover melhores condições de trabalho, metas econômicas, ambientais, dentre outras nos próximos anos, daí muitas marcas surfaram na onda e o tema tem sido cada vez mais frequente nos reports e relatórios das empresas. Já os investidores estão levando mais a sério e destinando muita grana a projetos e empresas mais sustentáveis, criando uma verdadeira onda verde, que com o tempo, está ganhando outros tons.

Já ouviu falar das metas ESG?

Essa forma de gestão pode tratar de metas ambientais (entenda o ambiente natural aqui), por exemplo: zerar a emissão de carbono até 2030, mas pode falar de outros ambientes, como o do trabalho em si, abordando outros temas, como a equidade de gênero na direção da empresa e até de formas de gestão mais transparentes.

Por isso, não deveria ser só sobre natureza, certo? Mas vamos falar só dessa parte então. Sobre os produtos verdes. A propaganda atual não fala de outro assunto e novas campanhas estão surgindo com essa pegada. Aí chega o job para nós publicitários e fazemos a nossa parte: criamos novas embalagens, novos selos próprios e textos lindos falando de propósitos das “empresas do futuro”, colocando tudo num mesmo caldeirão de promessas, dívidas e dúvidas. Para piorar, é comum existir um desalinhamento entre estratégia da empresa e publicidade das mesmas, escancarando o problema e gerando frutos capengas: campanhas sustentáveis incríveis e bem produzidas, sem uma transparência ou real compromisso da marca com os consumidores no longo prazo.

Mas a coisa fica mais problemática quando não conseguimos acompanhar essas novas promessas e metas propostas (Dúvidas comuns: quem for impactado por uma propaganda dessas hoje vai estar vivo em 2080 para conferir se bateram a meta? E se não cumprirem quem responde por isso?). Resultado: já existem muitos processos no CONAR contra marcas pequenas, médias e grandes por aí, investigando possível propaganda enganosa nesse tipo de campanha que, cá entre nós, pode ser causada por dois fatores: má-fé ou simplesmente uma falta de conhecimento geral (sim, não descarto e posso ser ingênuo nisso). Por isso, separei alguns pontos importantes para você se proteger das desinformações e comprar seus produtos sem ser enganado(a).

4 ruídos perigosos na comunicação de “produtos sustentáveis” que configuram greenwashing.

1- Mentir ou falar meias verdades (nem a cara de pau de algumas marcas é de madeira de reflorestamento)
Se a embalagem diz algo como “produto ecológico”, “sem ingrediente animal”, “não testado em animais” ou qualquer outra afirmação sustentável, mas não possui certificação oficial e nem dados científicos para confirmar ou nem indica onde se consultar mais informações, sai dessa que é cilada, Bino! O selo CCF Rabbit (Choose Cruelty-Free) é um bom exemplo de certificado válido com padrões internacionais de proteção aos animais que visam também toda a cadeia de fornecedores. Aqui tem mais alguns selos reconhecidos: https://idec.org.br/greenwashing/desvende-os-selos

2- Destacar uma questão sustentável menos relevante para ofuscar outras mais importantes
É como tentar vender o copinho plástico dizendo que ele ajuda na economia de água do planeta já que pode ser descartado e evita a lavagem. Ou seja, não importa se você fez uma pesquisa e chegou à conclusão de que existe uma economia de 50% de água ao usar o copo plástico descartável. Seu trabalho já nasceu enviesado e favorece a “troca oculta”, pois gera uma falsa sensação de proteção e benefício, escondendo um problema muito maior. E todo plástico que vai pro mar? É neste tipo de malabarismo marketeiro que precisamos ficar de olho!

3- Falar vagamente sobre “ser sustentável”
Criar um selo verdinho bonitinho, com uma frase do tipo “produto amigo do meio ambiente”, sem nenhuma explicação clara de como aquele produto ajuda o meio ambiente, é sim greenwashing, mesmo sendo muito bonitinho e mesmo sendo verdade de alguma forma. A sua empresa está realmente fazendo algo importante e você está ocultando essa boa ação? Então é uma falha de comunicação. Crie mecanismo para mostrar isso e deixe explícito que você está fazendo algo realmente acima da média. Seu produto é amigão do meio ambiente? Mostre que é! Tudo que for diferente disso é greenwashing!

4- Destacar informação irrelevante (parece incrível, mas não é)
Sabe aquela informação que parece super sustentável, mas na verdade é uma obrigação legal? É isso. Um bom exemplo são os aerossóis, tipo desodorantes, que colocam frases como “Não contém CFC”. Essa substância nociva ao meio ambiente já é proibida por lei desde 1988 no Brasil. Não estão mentindo pra você, mas sinto cheiro de greenwashing aí!

Ser sustentável é…

Para dar o próximo passo precisamos deixar bem claro um conceito aparentemente simples, mas cheio de nuances: o tal “ser sustentável”. O que é ser sustentável pra você? Ser sustentável, apesar de ter um forte apelo de cuidado com a natureza, é bem mais amplo que isso e se refere à sustentabilidade (manter-se funcionando a longo prazo) de um negócio como um todo. Essa empresa vai sobreviver no futuro? Ela se sustenta e sustenta o entorno dela, a comunidade, a natureza, a sociedade e todos os stakeholders para que haja um futuro digno para as futuras gerações? Somente com esse olhar ela poderá dizer que visa ser sustentável.

Para se ter uma ideia, as empresas que são referência nesse tema ainda possuem inúmeros problemas ambientais e metas ESG a serem batidas. Até uma Natura da vida que já fez muita coisa está em processo de ser mais sustentável e melhoria contínua com metas que vão além de 2030. Outras empresas nem mostraram indícios de que querem ser, pois não firmaram compromissos públicos sobre isso e nem mudaram suas formas de gestão. Esse tipo de empresa adora colocar uma frase de efeito por aí, como nas assinaturas de e-mail: “não imprima, recicle”, achando que vai salvar o mundo assim.

Nessas horas, saem na frente, não as empresas mais verdes, mas as mais transparentes, que sabem o impacto negativo que causam (e todas causam) e estão verdadeiramente trabalhando para reverter esse cenário e ficar na cabeça dos consumidores pelos motivos certos.

Leitura obrigatória para entender melhor sobre o tema e fazer a sua parte: https://idec.org.br/greenwashing

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Sobre ideias brilhantes e gárgulas

Trabalhar com comunicação e publicidade nos dá o prazer que poucos trabalhos oferecem: conhecer universos e negócios diferentes a cada novo job. Diante de tantos desafios da nossa geração, será que estamos realmente respondendo aos anseios com projetos relevantes?

Gárgulas são estátuas de seres alados ou bizarros que ficam no alto das igrejas ou prédios góticos. Uma figura da Idade Média que ficou popularmente conhecida nas histórias e desenhos como o do corcunda de Notre-dame, mas que revelam uma origem um pouco menos fantasiosa. Ao contrário do que parece, ela não foi criada para espantar maus espíritos ou gerar pesadelos nos visitantes que passam abaixo delas. A funcionalidade da gárgula é bem prática e menos mística: esconder os canos das calhas e ajudar a escoar as águas das chuvas para longe das paredes das construções.

Foi em uma pesquisa para um Naming de uma nova marca que eu descobri essa história e naquele momento todo um véu de mistério que eu mantinha sobre essas criaturas antigas caiu. Foi como se uma luz misteriosa se apagasse para se acender uma nova. “A gárgula é impactante e útil” – conclui. Assim deveriam ser as propagandas.

O grande W. Olivetto em uma recente entrevista criticou as novas gerações de publicitários, dizendo que antigamente as ideias eram mais divertidas, brilhantes e vendiam mais. Em partes, concordo com o cara. Afinal, com o acesso (ilimitado) de informação e envolvimento cada vez maior das pessoas nas redes sociais, temos o terreno perfeito para abraçar nossos clientes com propagandas que realmente façam a diferença. Eu sinto também que não estamos fazendo nossa parte, mas ao mesmo tempo, não acho que tenhamos que ser brilhantes sempre. Aliás, o que é ser brilhante? Será que podemos acompanhar tantas mudanças sociais e tecnológicas? A propaganda precisa buscar um novo papel na sociedade?

Com mais perguntas do que respostas, eu fico observando, do alto do meu prédio, como as gárgulas fazem, imaginando o que se passa na cabeça dos clientes, lá embaixo. Como me aproximar sem assustar? Como envolver? Como alçar novos voos?

E você? O que vê do seu prédio?