Prepare-se para negociar com robôs: compra agêntica vai revolucionar o e-commerce e a publicidade

Por Rafael Schettini, head de Dados e Operações da Relevanc*

O que acontece quando não somos mais nós que escolhemos o que comprar, mas nossas inteligências artificiais? Esse foi o ponto de partida de uma discussão instigante que revela muito sobre o futuro da publicidade, do e-commerce e do próprio retail media. A ideia de “compra agêntica” – negociações máquina-a-máquina, em que agentes autônomos decidem, comparam preços e concluem transações – levanta questões cruciais sobre como será o consumo nos próximos anos.

Durante a última edição do Good Morning Retail Media, esse debate ganhou força em um painel que participei ao lado de Pyr Marcondes (Macuco Hub) e Alexandre Kavinski (WMS), vozes que têm acompanhado de perto essa transformação.

O conceito de compra agêntica

Um dos pontos mais instigantes do debate foi a “compra agêntica”, que é o momento em que IAs passam a interagir diretamente em processos de compra, negociação e decisão de consumo. Não estamos falando de um futuro distante. Pelo que podemos notar, em dois ou três anos será comum termos agentes digitais que, com base em nossos dados e preferências, irão escolher, comparar preços, negociar prazos de entrega e concluir compras em nosso lugar.

Esse avanço irá revolucionar o mercado e romper paradigmas. Se hoje a jornada de compra ainda depende da navegação ativa de consumidores em buscadores e e-commerces, em breve poderemos assistir à consolidação de um novo modelo: o de negociações máquina-a-máquina, em que o consumidor delega parte de seu processo de decisão a um agente autônomo.

O e-commerce como infraestrutura de dados

Esse novo cenário exige repensar profundamente o papel do e-commerce: formatos tradicionais de retail media (banners e produtos patrocinados) foram concebidos para influenciar humanos, não algoritmos. Quando a jornada passa a ser automatizada por agentes de IA, esses formatos perdem sua relevância.

A consequência disso é que o e-commerce deixa de ser uma vitrine e passa a ser uma infraestrutura de dados, capaz de fornecer informações completas e estruturadas para alimentar os agentes autônomos. Catálogo de atributos, políticas de entrega, confiabilidade dos reviews, histórico de preços: tudo passa a ser fundamental para garantir que o algoritmo escolha aquele produto, marca ou loja.

Não se trata de ficção científica. Grandes players já estão nesse caminho. O Walmart, por exemplo, criou um agente aberto, chamado Sparky, para interagir com outros agentes e ajudar consumidores em suas decisões. Já a Amazon aposta em um ecossistema mais fechado, integrado à Alexa+, com foco em manter sua lógica própria de monetização com publicidade.

On-site, off-site e a relevância das lojas físicas

Embora o avanço das estratégias digitais seja inegável, não podemos esquecer que o ambiente físico continua tendo peso decisivo no varejo. Prova disso é que, mesmo com a expansão do e-commerce, 87% das vendas do GPA ainda acontecem no offline. Ou seja, a loja física permanece (e continuará sendo) um pilar central do consumo no Brasil.

Nesse contexto, os impactos da Inteligência Artificial tendem a ser mais graduais: dificilmente veremos robôs fazendo compras em supermercados, mas podemos esperar uma renovação dos ativos tradicionais de trade marketing. Pontas de gôndola, carrinhos personalizados ou degustações podem ganhar nova relevância quando integrados à lógica do retail media, especialmente porque agora há mais capacidade de mensuração. Conectar essas ações offline a resultados concretos de vendas abre espaço para estratégias mais sofisticadas e eficazes.

Já no ambiente digital, o off-site também ganha relevância. Com a jornada de compra sendo cada vez mais permeada por interações automatizadas, falar com consumidores em redes sociais, mídia programática e outros canais externos ao e-commerce torna-se fundamental para manter a marca presente e relevante.

No contexto da compra agêntica, a hiperpersonalização ganha um novo patamar: não se trata apenas de ofertas dirigidas a um consumidor específico, mas de algoritmos negociando em nome dele, ajustando escolhas de forma dinâmica e em tempo real. Ainda assim, isso não elimina a importância da mídia de massa. Pelo contrário: campanhas de grande alcance continuam fundamentais para consolidar narrativas culturais e posicionamentos de marca — o que depois pode ser traduzido pelos agentes autônomos em experiências hiperpersonalizadas no varejo e no ambiente digital.

O próximo capítulo do Retail Media

Para quem atua no ramo do marketing, essa discussão é especialmente relevante. O retail media já nasceu como um campo orientado a dados, mas a chegada da IA eleva a outro nível. Se antes a questão era segmentar consumidores por seu histórico ou preferências de compra, agora o desafio é preparar nossos dados, algoritmos e narrativas para dialogar com outros algoritmos.

Isso implica investir em infraestrutura, em metodologias de mensuração e, sobretudo, em inovação. Significa também ajudar marcas e varejistas a entenderem que, no novo cenário, o dado não é apenas ativo, é linguagem. É por meio dele que as máquinas vão se comunicar, negociar e tomar decisões.

Nesse contexto, uma questão que merece reflexão é se, no futuro, as próprias inteligências artificiais poderão evoluir de facilitadoras a protagonistas também no papel de players de mídia.

*Rafael Schettini possui 10 anos de experiência na área de inteligência de dados, com passagens por agências de publicidade e pelo setor varejista. Atua há 4 anos na RelevanC, onde lidera iniciativas de insights de dados e otimização de campanhas. Atualmente é Head de Dados e Operações de Mídia da empresa.

A revolução das personas sintéticas e o futuro do branding

Por Alex Espinosa*

No cenário atual de rápidas transformações tecnológicas, uma inovação promete revolucionar o mundo do branding e do design: as personas sintéticas. O conceito está redefinindo a maneira como entendemos e interagimos com o público-alvo, abrindo um novo horizonte de possibilidades para estratégias de marca.

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

É comum que surja o questionamento: o que são exatamente essas personas sintéticas? Elas representam ferramentas inteligentes capazes de simular comportamentos humanos com uma precisão surpreendente. Essas entidades virtuais projetam indivíduos ou grupos específicos, replicando suas características, preferências e ações. Alimentadas por vastos conjuntos de dados e algoritmos avançados, as personas sintéticas nos permitem prever comportamentos, testar hipóteses e refinar estratégias de marca de forma inovadora e eficiente.

A transformação que essa tecnologia traz para o setor de branding é multifacetada, já que possibilita a criação de gêmeos digitais dos consumidores, oferecendo insights sobre suas necessidades e desejos. Isso permite que as marcas testem múltiplas hipóteses simultaneamente, minimizando riscos e acelerando a inovação das empresas.

Além disso, as personas sintéticas colocam o consumidor no centro do processo de design, conferindo conceitos e avaliando cenários de forma dinâmica e orientada por dados. O reflexo do real é capaz de criar um mundo virtual, onde é possível prever comportamentos futuros e testar diferentes estratégias de marca. Assim, os resultados vão desde a personalização em massa das experiências do consumidor até a otimização de recursos de marketing com base em simulações complexas.

O conceito chega a um patamar ainda mais fascinante, podendo gerar agentes autônomos de IA avançados, com memória para planejar e recursos para agir, promovendo um ciclo contínuo de refinamento estratégico e satisfação. Essas entidades podem aprender e evoluir com cada interação. Um ecossistema de marca onde as personas sintéticas dialogam entre si, criando um ambiente dinâmico de aprendizado contínuo, permite o encontro rápido de padrões e insights que seriam impossíveis de se obter por meio de métodos tradicionais. A capacidade desses agentes em processar e analisar dados em tempo real abre portas para um branding adaptativo, onde as estratégias podem ser ajustadas instantaneamente em resposta às mudanças no mercado ou no comportamento do consumidor.

Entretanto, é crucial abordar essa tecnologia com cautela e responsabilidade. Embora ofereça insights valiosos, a pesquisa com usuários sintéticos não deve substituir a interação com pessoas reais. A interpretação dos dados gerados por IA tem limitações, especialmente quando se trata de capturar nuances emocionais e reações humanas complexas. Assim, é fundamental implementar auditorias algorítmicas e diretrizes éticas rigorosas para garantir o uso responsável e imparcial da ferramenta.

As personas sintéticas representam uma solução poderosa para o arsenal do profissional de branding moderno. Elas nos permitem navegar pelo futuro do design com maior precisão e eficiência. Ao abraçar essa inovação de forma criteriosa, experiências de marca mais significativas, relevantes e impactantes são alcançaveis, elevando o potencial criativo das equipes e, transformando a conexão com o público-alvo.

*Alex Espinosa é sócio e Head de Inovação da CBA B+G, com experiência em marketing e inovação em empresas como Pepsico e Danone. O especialista se dedica a incentivar coporações a desenvolverem estratégias inovadoras para crescer e gerar valor.