Coluna “Discutindo a relação…”

Criação e Mídia: quando a união faz a força das ideias

Por Josué Brazil (com ajuda de IA)

Imagem gerada através de IA do Canva

No universo da publicidade, a relação entre as áreas de Criação e Mídia é, muitas vezes, retratada como um jogo de forças, cada uma com suas prioridades e visões. Entretanto, quando há integração real e colaborativa entre esses dois pilares, o resultado é sempre mais estratégico, eficaz e memorável para marcas e produtos.

A Criação pensa o conceito, a linguagem, o impacto emocional. Já a Mídia é quem garante que essa mensagem chegue às pessoas certas, no momento ideal, com a maior eficiência possível. Quando essas duas áreas trabalham em sintonia desde o início de uma campanha — e não em etapas isoladas — o potencial de inovação e performance se multiplica.

Uma campanha começa antes do briefing criativo

Muitas vezes, o erro está na estrutura tradicional do processo: a Mídia faz seu planejamento, entrega o briefing, e a Criação desenvolve a campanha com base nesse roteiro. Mas as campanhas mais relevantes dos últimos anos mostram que quando Criação e Mídia co-criam desde o início, o pensamento ganha novas dimensões.

Um exemplo emblemático dessa integração é o case “Real Beauty Sketches”, da Dove. Criada pela Ogilvy Brasil, a campanha utilizou vídeos emocionantes mostrando mulheres se descrevendo para um retratista forense, revelando o quanto as percepções pessoais são distorcidas. O conteúdo era poderoso, mas o que fez dele um fenômeno global foi o planejamento de mídia digital altamente estratégico: a veiculação começou no YouTube com foco em influenciadoras e comunidades sensíveis ao tema da autoestima feminina. O resultado? Um dos vídeos mais compartilhados da história da internet à época, com mais de 180 milhões de visualizações.

Mídia como parte da ideia criativa

Outro grande exemplo dessa integração aconteceu com a campanha “Tweeting Potholes” da Ponto de Partida (Panamá). A agência criou sensores em buracos reais nas ruas da cidade, que tuitavam automaticamente menções às autoridades locais sempre que um carro passava por eles. Além da criatividade e da tecnologia, o sucesso da ação veio de um plano de mídia ousado: alavancaram os tweets como mídia espontânea e contaram com o engajamento de influenciadores locais. O impacto foi tão grande que levou o governo a iniciar reformas viárias rapidamente.

Nesse caso, a mídia não foi apenas o canal de veiculação — ela era a própria ideia.

A união gera performance

Além dos grandes cases, mesmo em campanhas do dia a dia, a integração entre Criação e Mídia pode ser o diferencial entre uma ideia comum e uma campanha com resultados extraordinários. Um bom criativo que entende de mídia pode propor formatos e soluções inovadoras para o meio. Um bom profissional de mídia que entende de criação pode encontrar oportunidades únicas de amplificar o conceito da campanha, seja em DOOH (Digital Out Of Home), mídia programática, ativações de guerrilha ou branded content.

Essa aproximação também é estratégica no momento de mensurar resultados: ao cruzar dados de mídia com aprendizados criativos, é possível otimizar campanhas com muito mais inteligência, adaptando mensagens por canal, momento ou perfil de audiência.

Áreas complementares

Criação e Mídia não são rivais, nem operam em paralelo. São áreas complementares que, quando trabalham juntas desde o início, entregam campanhas mais relevantes, mais criativas e mais eficazes. Essa colaboração é o caminho para a propaganda que não apenas encanta, mas também performa. Afinal, uma grande ideia só é grande de verdade quando encontra o seu público — e é aí que a mágica acontece.

Reporte inédito desvenda narrativas da publicidade

Estudo liderado pela BALT, com apoio de Dove, VML e ESPM, explica como algumas histórias são eternamente adaptadas – e como elas geram negócios

Imagem de Chen por Pixabay

Sabemos que o sucesso de uma campanha depende da criatividade para criar histórias envolventes. Mas será que as narrativas publicitárias são assim tão diferentes? Encorada em antropologia, sociologia e psicologia, a BALT empreendeu um estudo longitudinal com campanhas que foram sucesso de mercado e crítica. O resultado demonstrou que a maioria delas gira em torno de 8 grandes “narrativas humanas” – histórias arquetípicas que circulam em diferentes culturas desde os primórdios da humanidade. Universais e existenciais, essas narrativas podem servir como poderosos drivers de comportamento e consumo. Mas se as mesmas histórias se repetem, por que algumas campanhas sustentam resultados mais duradouros?

Endereçando essas questões, o estudo foi enriquecido com dois painéis de debate reunindo anunciantes, agências e especialistas em marketing na ESPM. No primeiro, premissas em torno das narrativas humanas foram detalhadas a partir do estudo de casos da empresa mais premiada da história do Cannes Lions International Festival of Creativity, a Unilever. No segundo, contextualizamos o papel da Inteligência Artificial (IA) na criação de storytelling. Para essa empreitada, contamos com a colaboração de Thaís Hagge (Global VP de Marketing de Dove), Marianna Ferraz (Brand Manager de Dove) e Sumara Osório (CSO para Colgate-Palmolive Latam na VML e jurada da categoria Creative Strategy do Cannes Lions 2024), convidadas da BALT.

Muitos jeitos de contar a mesma história

O fascínio pelo proibido, a luta entre bem e mal; tensões do tempo e vida eterna, criador e criatura, pertencimento; identidade e lugar no mundo e o desejo de experimentar uma vida além do corpo. Essas são as grandes temáticas que estampam campanhas dos mais diversos setores, épocas e locais. Além de identificar e qualificar essas narrativas humanas, o estudo demonstrou como elas se desdobram em “narrativas culturais” – histórias historicamente localizadas que captam e traduzem o espírito do tempo.

Por exemplo: ao analisar questões de identidade e lugar no mundo, chegamos a uma série de campanhas que projetam um ideal de masculinidade. “É interessante ver como o apelo do cowboy foi construído e como deu lugar ao veterano de guerra ou ao businessman, até chegar a uma masculinidade mais smooth”, exemplifica Ana Holtz (BALT).

Outra narrativa humana, a atração pelo proibido, já era tema central na Ilíada e na Odisseia, os primeiros livros do ocidente. Milênios depois, em 1993, o tema aparece no anúncio “Umbigo” do Guaraná Antártica Diet, com a sensualidade do corpo masculino a um toque de distância. As provocações da Benetton nos anos 2000 foram emblemáticas desse mesmo fascínio por desafiar o status quo. Em 2014, a campanha “Like a Girl”, da Always, foi pelo mesmo caminho e se tornou uma das mais populares da história.

Além do storytelling

O sucesso de Dove comprova que boas ideias se fundamentam em pesquisa e estratégia. “Não é sobre surfar nas narrativas estabelecidas, nem sobre polemizá-las, simplesmente. A ideia de celebrar a Beleza Real não veio do nada, mas emergiu de uma das maiores pesquisas globais de comportamento já empreendidas.” contam Thais Hagge e Marianna Ferraz (Unilever).

Para Emmanuel Publio Dias (ESPM), a chave do sucesso de Dove é articular narrativas humanas e culturais na publicidade e além dela. Em nome de seus consumidores, Dove pressionou políticas publicas de mobilidade e inclusão de corpos diversos e se colocou contra o preconceito por tipo de cabelo (afro, branco etc.), influenciando a aprovação do CROWN Act em 2019 – a lei antidiscriminação por cabelo. Na última campanha, Dove assumiu o compromisso de não distorcer imagens de corpos humanos em sua publicidade e criou um banco de imagens de corpos femininos diversos e naturais que foi carregado em sistemas de busca vinculado ao termo-chave “mulher-bonita”.

“Dove congrega mulheres diferentes, mas afetadas pelos mesmos discursos e padrões de beleza. A marca articula questões muito atuais com pautas universais, como a identificação de grupo, a vontade de mudar o mundo e sentidos de singularidade.”, destaca Lucas (BALT). Usando os termos propostos por Sumara (VML), “temas timeless são tratados de forma oportuna e relevante, ou seja, timely”.

Por fim, o estudo considerou como tecnologias digitais estariam atuando na construção e circulação de narrativas humanas e culturais. Bias, preconceito e outros vieses de IA são questões em alta em Cannes, mas a aposta é que sejam fatores paulatinamente equacionados. A expectativa é que IA ofereça soluções positivas, práticas e ágeis para problemas cotidianos do marketing, como a personalização, o hypertargeting e o monitoramento das respostas do mercado.

Mas se IA é útil para monitorar e reconhecer padrões, pode ser menos efetiva para decodificar porque eles surgem e mudam. Na visão de Sumara (VML), gráficos e layouts podem ser feitos por automações, mas criatividade e estratégia seguem no domínio humano. Diante de um mar de dados e de um sem-fim de formatos e apelos similares, nada substitui o olhar humano.

Por fim, uma possibilidade inquietante: a inserção de anúncios em sonhos, enquanto dormimos, que tanto causou furor na última edição do Festival de Cannes. Embora exploratório, o exemplo lembra que, embora os anseios humanos sejam mais ou menos estáveis, a maneira como histórias circulam e nos afetam pode mudar consideravelmente com o tempo. “O conselho para as marcas é ficarem atentas ao que emerge na cultura e no mercado sem perder de vista o que é atemporal, aquilo que baliza quem somos e oferece sentidos à aventura humana na Terra.”, encerram Ana e Lucas (BALT).

SOBRE A BALT

A BALT é um hub de pesquisa, tendências e estratégia especializado em comportamento do consumidor. Marcas e consumidores são estudados partir de uma metodologia proprietária, ancorada em psicologia, sociologia e antropologia. Monitoramos as tensões culturais da sociedade, produzindo insights estratégicos e soluções criativas para ajudar marcas a prosperar em um mundo complexo, cada vez mais difícil de ser compreendido.

SOBRE A ESPM

A ESPM é uma escola de negócios inovadora, referência brasileira no ensino superior nas áreas de Comunicação, Marketing, Consumo, Administração, Economia Criativa e Tecnologia. Seus 12 600 alunos dos cursos de graduação e de pós-graduação e mais de 1 100 funcionários estão distribuídos em quatro campi – dois em São Paulo, um no Rio de Janeiro e um em Porto Alegre. Possui quatro unidades regionais em Florianópolis, Chapecó, Goiânia e Salvador. O lifelong learning, aprendizagem ao longo da vida profissional, o ensino de excelência e o foco no mercado são as bases da ESPM.

SOBRE DOVE

Dove começou sua história em 1957 nos EUA, com o lançamento do Beauty Bar, com sua mistura patenteada de limpadores suaves e ¼ de creme hidratante. A herança da Dove é baseada na hidratação, e não foram as promessas, mas sim as provas que permitiram à Dove crescer de um Beauty Bar para uma das marcas de beleza mais queridas do mundo.

As mulheres sempre foram nossa inspiração e, desde o início, estamos totalmente comprometidos em fornecer atendimento superior a todas elas e defender a beleza real em nossa publicidade. Dove acredita que a beleza é para todos e que precisa ser uma fonte de confiança, não de ansiedade. A missão de Dove é inspirar as mulheres em todos os lugares a desenvolver um relacionamento positivo com sua aparência e descobrir seu potencial de beleza.

SOBRE A VML

Resultado da fusão da VMLY&R e da Wunderman Thompson, a herança da VML é construída sobre mais de 300 anos de experiência e conhecimento combinados, onde a criatividade encontra a tecnologia. Nossa expertise abrange toda a jornada do cliente, oferecendo insights profundos em comunicações, trade, consultoria, CRM, CX, dados, produção e tecnologia. Nossa família global abrange mais de 28.000 funcionários em mais de 150 escritórios em mais de 60 mercados.