IA na publicidade: a revolução que está redefinindo o jogo das agências

O presidente da Abradi, Carlos Paulo Jr.

Enquanto Sam Altman prevê que 95% do trabalho criativo será automatizado, presidente da Abradi aponta caminhos para profissionais se reinventarem no novo cenário

A publicidade vive seu momento mais disruptivo desde a migração para o digital. Se antes a transformação veio com Google e Meta ‘roubando’ verbas da TV e jornais, agora a inteligência artificial está mexendo com algo que parecia intocável: a criatividade humana. E não estamos falando de um futuro distante, isso já está acontecendo. O CEO da OpenAI, Sam Altman, afirma que a IA executará 95% do trabalho de marketing criativo e Mark Zuckerberg vai na mesma linha, prometendo que as marcas logo poderão simplesmente dizer seus objetivos e orçamento para a Meta, que “fará o resto”.

Declarações assim fazem qualquer publicitário engolir seco. Mas será que é realmente o fim da linha para as agências tradicionais? Google, Meta, ByteDance e Amazon controlam agora mais da metade do mercado global de publicidade. Mas o que realmente chama atenção é como essas plataformas estão avançando na criação de conteúdo, território que sempre foi das agências. O TikTok agora gera comerciais de vídeo a partir de textos simples. A Meta personaliza automaticamente textos publicitários para diferentes públicos em dez idiomas. A Kalshi criou um comercial cinematográfico completo em 48 horas, gastando apenas US$ 2 mil, usando ferramentas do Google.

Reinvenção, não extinção

Carlos Paulo Júnior, presidente da Abradi, não vê essa transformação como uma sentença de morte. Para ele, é hora de reposicionar competências. “A IA executa tarefas repetitivas com rapidez, mas decisões estratégicas complexas ainda dependem do entendimento humano”, explica. Ele afirma que os profissionais precisam focar em quatro pilares fundamentais: pensamento estratégico e crítico; curadoria e supervisão criativa; integração tecnológica (saber quando, como e por que usar cada ferramenta de IA na prática) e inteligência emocional (gestão de pessoas e aspectos relacionais que a IA simplesmente não consegue replicar). “Enquanto a IA resolve o operacional, humanos ainda dominam as decisões complexas que definem o rumo das campanhas, como desenvolver a habilidade de orientar e refinar resultados gerados por IA, garantindo originalidade e alinhamento com valores da marca”, destaca Jr.

Quando máquinas passam a consumir anúncios

Talvez a mudança mais radical esteja no próprio conceito de audiência. Estamos entrando numa era onde agentes digitais “consomem” anúncios e fazem recomendações para humanos. Quando alguém pergunta ao ChatGPT sobre a melhor marca de lençóis, a resposta não vem de pesquisa tradicional, mas do que a IA “aprendeu” sobre essas marcas. “O cenário onde agentes digitais consomem anúncios altera profundamente a relação marcas-consumidores”, observa Carlos Paulo. “O foco se desloca de persuasão direta para otimização técnica de conteúdo para influenciar algoritmos.”

Isso criou uma corrida completamente nova. Empresas agora produzem conteúdo especificamente para “alimentar” modelos de IA. Descrições detalhadas de produtos que fariam qualquer humano adormecer podem ser cruciais para convencer um algoritmo a recomendar determinada marca. “Marcas precisarão criar conteúdos e dados estruturados específicos para influenciar diretamente as recomendações dos LLMs”, explica o presidente da Abradi. Isso significa desenvolver técnicas especializadas de SEO algorítmico e construir reputação digital sólida.

Equipes híbridas: o futuro já chegou

Muitas empresas já aplicam agentes de IA em todos os processos corporativos, inclusive no marketing. Nesse cenário, Carlos Paulo enfatiza a importância de “definir claramente o papel da IA e dos humanos nas equipes, destacando complementação, não substituição”. Para ele, empresas devem investir em treinamento contínuo e promover cultura aberta à inovação.

Diante desse novo cenário, o presidente da Abradi destaca que as empresas devem manter o foco na construção de reputação digital. “É preciso garantir credibilidade e clareza nas informações fornecidas online, que serão consumidas por LLMs para gerar recomendações. Outras recomendações são a utilização do SEO e da otimização algorítmica avançada para influenciar positivamente modelos de IA.”

Toda essa transformação traz dilemas complexos. Como garantir transparência quando consumidores interagem com conteúdo mediado por IA? Como proteger privacidade dos dados? Quem é responsável quando um agente digital faz recomendação problemática? “Empresas deverão ter clareza sobre suas responsabilidades ao influenciar agentes digitais, evitando preconceitos e discriminação de qualquer natureza”, alerta Carlos Paulo. A implementação de políticas rigorosas de transparência torna-se essencial.

A revolução da IA na publicidade não é mais possibilidade futura, é realidade presente. Carlos Paulo Júnior e a Abradi apostam que quem abraçar, entender e souber utilizar a tecnologia terá seu lugar de destaque. A questão não é se a IA vai transformar a publicidade, mas quem vai liderar essa transformação. As próximas jogadas determinarão se as agências tradicionais se tornarão peças de museu ou evoluirão para algo ainda mais poderoso: orquestradoras de uma sinfonia onde humanos e máquinas criam juntos o futuro da comunicação.

Fonte: Moneta Comunicação Estratégica – Beatriz Torrecilia Mendes

Dando chance a quem pensa diferente de você

Por Josué Brazil

Essa semana faleceu Oliviero Toscani. O inicialmente fotógrafo italiano que alcançou destaque mundial ao passar a cuidar da publicidade da marca Benetton, uma marca do mundo da moda.

Toscani era amado e odiado em uma época ainda distante das redes sociais e de suas muitas polêmicas e ondas de cancelamento.

O fato é que, tempos depois, Toscani teve grande parte de seu trabalho reconhecido e sua morte foi amplamente comentada e lamentada por várias figuras e setores do mercado publicitário nacional e mundial.

Tenho, entretanto, que confessar uma coisa a vocês: de início o trabalho dele não me agradava, não me convencia. Eu era meio contrário a ele. Coisas, talvez, de um jovem publicitário muito apaixonado e convicto dos dogmas inquebráveis da boa e velha publicidade.

Lembro de ter assistido ao Roda Viva em que ele foi o entrevistado e ter, inicialmente, me posicionado contra as coisas que ele colocava enquanto respondia aos questionamentos. Lembro também de ele ter sido hostilizado por um famoso – e também já falecido – publicitário brasileiro. Hostilizado mesmo. Atacado direta e frontalmente. E ele se portou de maneira educada e digna.

Comprei o livro que ele escreveu (e o tenho até hoje) pra entender melhor o que fazia e porque fazia. E gostei. Aprendi que é muito importante ler, ouvir e conhecer aquilo que nos é inicialmente estranho e contrário. Aprendi a dar uma chance ao contraditório.

Refletindo ontem e hoje a partir da notícia de seu falecimento, penso que o trabalho dele foi disruptivo, em uma época que essa palavrinha ainda não havia sido “descoberta” e anexada definitivamente ao vocabulário publicitário mundial.

Oliviero trouxe uma nova maneira de pensar a publicidade. Uma maneira que integrava a crítica social, que incorporava o assustador, o chocante e o real a um mundo perfeitinho, plastificado, estilizado e estereotipado da propaganda de então. Hoje vivenciamos o momento da propaganda sem cara de propaganda, do marketing sem jeitão de marketing e etc.

Hoje vemos castings mais reais, mais preocupação com diversidade e inclusão, menos produto e mais conceito, menos propaganda e mais conteúdo.

Pode ter certeza: tem muitas sementes lançadas ao vento pelo Toscani nisso tudo que vemos por aí atualmente!